terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Clovis Bate Bola

Dizem que Clovis Bate Bola é:





Que Foi Criado Pela:





Que Sua Mãe é:





Que brincava de:






E que gosta de;





Dentro de todas as falácias proferidas contra ele, pelo menos ele não é:








Muito menos pratica:


Se querem falar da vida pessoal de alguém, dentro de uma discussão política, peça emprego em uma revista de fofocas e mesmo assim faça o favor de checar as fontes: Discussão no campo das ideias, alguém sabe fazer?

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Podcast 14 com Cizinho Afreeka



Bloco 1

Imortal Technique - Natural Beauty
Elza Soares - Amor Perfeito
Marcão Baixada - Final Feliz


Bloco 2

Manuela Rodrigues - Vende-se Poema
Juçara Marçal e Kiko Dinucci - Oba Ina
Di Melo - Se o Mundo Acabasse em Mel


Bloco 3

Jose James - Love Conversation
Pharoahe Monch - Let my people go
Os Tincõas - Embola Embola


Bloco 4

Skindread - Street Avenue
Simples Rap - Hiena Mazoki
Mano Gláucio - Minissérie da vida real, ficção sim, realidade não

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

The Roots - Undun


Undun é o curta que complementa o disco lançando pelo The Roots. Bom, para quem gosta de cinema é uma boa pedida, para quem gosta de rap é uma boa pedida e para quem acredita na arte como mudança é uma boa pedida. Assistam


The Roots - UNDUN from The Ghettonerd Company, LLC on Vimeo.

quinta-feira, 8 de dezembro de 2011

Luiz Silva Cuti: A empáfia do poeta Gullar



*Sempre destacarei respostas bem dadas aos racistas de plantão: A seguir, resposta do Luis Silva Cuti ao racista Ferreira Gullar.

Desdobramento texto de Ferreira Gullar - Preconceito Cultural. "Cruz e Souza e Machado de Assis foram herdeiros de tendências européias: não se pode afirmar que faziam literatura negra..." - Folha de São Paulo (Ilustrada) de 03/12/2011.

por Cuti enviado para o Portal Geledés

Por conta da publicação, em quatro volumes, da Literatura e Afrodescendência no Brasil: antologia crítica, organizada pelos professores Eduardo de Assis Duarte e Maria Nazareth Fonseca, seja pela apresentação gráfica sofisticada da obra, seja pelo seu aporte crítico envolvendo profissionais de diversas universidades brasileiras e estrangeiras, a questão de ser ou não ser negra a vertente da literatura brasileira que compõe seu conteúdo tem trazido à tona manifestações que vão desde respeitosas e aprofundadas abordagens até esdrúxulos pitacos de quem demonstra sua completa ignorância do assunto, má vontade e racismo crônico. Neste último caso está o que publicou Ferreira Gullar, com o título "Preconceito cultural", no caderno Folha Ilustrada, do jornal Folha de São Paulo, de 04/12/2011.

O autor do Poema Sujo, no qual compara um urubu a um negro de fraque, deve estar estranhando (estranheza é a palavra que ele emprega) que o negro não é uma simples idéia desprezível, mas um imenso número de pessoas, cuja maior parte, hoje, não come carniça, e que aqueles ainda submetidos à miséria mais miserável jamais quiseram fazer o trabalho daquela ave, e que se a "a vasta maioria dos escravos nem se quer aprendia a ler", como diz ele, não é porque não queria. Era proibida. Há vários dispositivos legais e normas que comprovam isso. Havia uma vontade contrária. Há e sempre houve um querer coletivo negro de revolta contra a opressão racista.

Quanto a existir ou não literatura negro-brasileira, deixemos de hipocrisia. No mundo da cultura só existe o que uma vontade coletiva, ou mesmo individual, diz que sim e consegue vencer aqueles que dizem não. Foi assim com a própria literatura brasileira e os tantos ismos que por aqui deixaram seus rastros. Características, traços estilísticos, vocabulário etc, que demarcam a possibilidade de se rotular um corpus literário, no tocante à produção literária negra, já vem sendo estudados. Basta lembrar três antologias de ensaios: Poéticas afro-brasileiras, de 2002, com 259 páginas;

A mente afro-brasileira (em três idiomas), de 2007, com 577 páginas; Um tigre na floresta dos signos, de 2010, com 748 páginas, além de outras reuniões de textos, estudos, dissertações e teses. Por outro lado, se Cruz e Sousa e Machado de Assis, como argumenta Gullar "foram herdeiros de tendências literárias européias", e, portanto, "não se pode afirmar que faziam literatura negra", o que dizer de Lépold Senghor e Aimé Césaire, principais criadores do Movimento da Negritude, embora herdeiros da tradição literária francesa? A literatura não é só resultado de si mesma. Só uma perspectiva genética tacanha desconheceria outras influências do texto literário, tais como a experiência existencial do autor, sua formação política e ideológica, o contexto social, entre tantas mais. Nenhum escritor é obrigado a reproduzir suas influências.

A maneira como o tal poeta cita o samba, a dança, o carnaval, o futebol é aquela que simplesmente aponta o "lugar do negro" que o branco racista determinou, um lugar que serviu de "contribuição" para que os brancos ganhassem dinheiro, não só produzindo sua arte a partir do aprendizado com os negros, mas também explorando compositores diretamente e calando-os na sua autoafirmação étnica. Basta inventariar quantos grandes compositores negros morreram na miséria. A essa realidade o poeta chama de: "nossa civilização mestiça". Mas, pelo visto, a literatura, sendo a menina dos olhos da cultura, deve ser defendida da invasão dos negros. O escritor e crítico Afrânio Peixoto, lá no passado, deixou a expressão bombástica sobre a literatura ser "o sorriso da sociedade". Gullar não pensa isso, com certeza, mas em seus pobres argumentos está a ruminar que a literatura não pode ser negra. Talvez sinta que a negrura pode sujá-la, postura bem ainda dentro do diapasão modernista que abordou o negro pelo viés da folclorização.

A esquerda caolha e daltônica brasileira sempre se negou a encarar o racismo existente em nosso país. Por isso andou e anda de braços e abraços com a direita mais reacionária quando se trata de enfrentar o assunto. Para ela, a mesma ilusão dos eugenistas, tipo Monteiro Lobato, se apresenta como verdade: o negro vai (e deve) desaparecer no processo de miscigenação. Para alguns cristinhos ressuscitados dos porões da ditadura militar e seus seguidores sobreviveria e sobreviverá apenas o operariado branco. Concebem isso completamente esquecidos de que a cor da pele e traços fenotípicos estão inseridos do mundo simbólico, o mundo da cultura. No seu inconsciente, o embranquecimento era líquido e certo, solução de um "problema". Hoje, é provável que os menos estúpidos já tenham se deparado com as estatísticas e ficado perplexos. Gullar, pelos seus argumentos, se coloca como um representante da encarquilhada maneira de encarar o Brasil sem a participação crítica do negro. E, como é de praxe, entre os encastelados no cânone literário brasileiro, incluindo os críticos, não ler e não gostar é a regra. Em se tratando de produção do povo negro, empinam e entortam ainda mais o nariz. Devem se sentir humilhados só de pensar em ler o que um negro brasileiro escreveu e, no fundo, um terrível medo de verem denunciado o seu analfabetismo relativo a um grave problema nacional: o racismo, ou serem levados a cuspir no túmulo de seus avós.

Gullar diz ser "tolice ou má-fé" se pensar um grande público afrodescendente como respaldo da produção literária negra. Será que ele algum dia teve em seu horizonte de expectativa o leitor negro? Certamente não, como a maioria dos escritores brancos. Isso, sim, é tolice, má-fé e, cá entre nós, uma sutil forma de genocídio cultural, próxima daquela obsessão de se matar personagens negros. E não adianta nesse quesito invocar um parente mulato como, em outros termos, fez o imbecil parlamentar racista Bulsonaro.

Antonio Cândido, em entrevista publicada na revista Ethnos Brasil, em março de 2002, com o título "Racismo: crime ontológico", fazendo sua autocrítica relativa à sua omissão, por muito tempo, do debate sobre a questão racial, argumenta que o "nó do problema" estaria "no aspecto ontológico", e prosseguindo: "está no drama, para o negro, de ter de aceitar uma outra identidade, renegando a sua para ser incorporado ao grupo branco." Façamos um acréscimo ao que disse o consagrado mestre. A questão racial é um problema ontológico no Brasil porque diz respeito também ao ser branco, pois o debate sobre o problema enfrenta a ilusão da superioridade congênita do branco, que o racismo insiste em manter cristalizada na produção intelectual brasileira. Ele, o branco, tem o drama de ser forçado a aceitar uma outra identidade que não aquela de superioridade congênita que o racismo lhe assegurou, de ser obrigado pelo debate a experimentar a perda da empáfia da branquitude, descer do salto alto. Aliás, o sociólogo Guerreiro Ramos nos legou um ensaio elucidativo do assunto, intitulado "A patologia social do branco brasileiro".

A produção intelectual não é tão somente uma exclusividade de brancos racistas, apesar de certa hegemonia ainda presente. Além de brancos conscientes da história do país, negros escrevem, publicam livros e falam não só de si, mas também dos brancos, dos mestiços e de todos os demais brasileiros. Quem não leu e não gostou dessa produção, em especial a do campo literário, já não está fazendo tanta diferença. A crítica binária,baseada no Bem X Mal, está enfraquecida. Um dos propósitos de seus defensores quando pensam negros escrevendo é o de tirar o entusiasmo dos filhos e dos netos daqueles que por muitos séculos lhes serviram a mesa e lhes limparam o chão e mesmo daqueles que ainda o fazem. A vontade coletiva negra está em expansão e não é só no campo literário. Assim, quando o poeta Ferreira Gullar diz que falar em literatura negra não tem cabimento, é de ser fazer a célebre pergunta: "Não tem cabimento para quem, cara-pálida?" A sua descrença no que chama de "descriminação" na literatura, crendo que ela não "vá muito longe" e gera "confusão" é o simples reflexo da baixa expectativa de êxito que a maioria dos brancos tem em relação aos negros, resultado dos preconceitos inconfessáveis, passados de geração para geração, para minar qualquer ímpeto de autodeterminação da população negra.

Para Aristóteles havia os gregos e o resto (os bárbaros). O branco brasileiro precisa superar este complexo helênico de pensar que no Brasil há os brancos e o resto (mestiços e negros). Tal postura é uma das responsáveis pelo descompasso da classe dirigente em face da real população. Certamente, essa é a razão de Lima Barreto, o maior crítico do bovarismo brasileiro, ainda ser muito pouco ensinado em nossas escolas. O daltonismo de Ferreira Gullar, advindo de um tempo de utopia socialista, hoje é pura cegueira. Traços físicos que caracterizam historicamente os negros não são

só traços físicos, como quer o articulista, mas representações simbólicas, por isso perfeitamente suscetíveis de gerar literatura com especificidades. Se o poeta não concebe negros possuidores de consciência crítica no país e as históricas particularidades de sua gente, devia fazer a sua autocrítica e não insistir na cegueira. Não dá mais para negar que a classe C está disputando também assentos no vôo literário, além dos bancos de universidades, nos shoppings e outros espaços sociais. E a população negra também faz parte dela. Quem não quiser enxergar vai continuar vivendo embriagado por esta cachaça genuinamente brasileira, produzida nos engenhos decadentes: o mito da democracia racial. Pena que alguns, de tão viciados, não largam a garrafa.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Grupo Vissungo. Não conhece? Conheça!!




Sempre com os irmãos Spírito Santo e Lula Spírito Santo à sua frente, o VISSUNGO, entre 1974 e 1996, teve uma carreira que foi marcada por uma longa temporada na Europa (Itália e Áustria) -- mais precisamente, de 1989 até seu fim. O grupo surgiu com a proposta de fundir a herança rítmica diaspórica de Diamantina, Minas Gerais (principalmente os cantos de trabalho de negros escravos mineradores da região, os "vissungos", originados em Angola), e seu entorno, com a música moderna que então se produzia na África, e que tanto prestígio tinha no continente europeu. Na época, a proposta do grupo não foi absorvida pelo mercado fonográfico ou mesmo devidamente compreendida pela crítica e pela comunidade musical brasileira, mais voltados à defesa, sem nuances, da preservação de formas culturais pretensamemente "puras" ou, então, da pura e simples assimilação do pop internacional. Daí, o "exílio" do grupo.

Formação atual do grupo VISSUNGO:
Spirito Santo -- Vocal, marimba, kalimba e percussão
Lula Espírito Santo -- Violão e vocal
Samuka de Jesus -- Percussão e vocal
Reinaldo Amâncio -- Guitarra
Jahir Soares -- Bateria
Leri Machado -- Baixo
Junior Crispim - Percussão

Dom Salvador e Abolição - Documentário '' Som sangue e raça ''

terça-feira, 29 de novembro de 2011

BRASIL: A COPA (NÃO) É NOSSA


Frei Betto

Para que um país funcione bem é preciso regras. São necessárias leis e aqueles que as façam cumprir, caso contrário, caímos numa anarquia. O Brasil possui mais leis que população. Em princípio, nenhuma delas pode contradizer a lei maior: a Constituição. Só na teoria. Na prática, e no próximo Campeonato de Futebol, a teoria é outra.

Ante o megaevento do futebol tudo se torna um transtorno. A legislação corre o perigo de ser ignorada e, se acontece assim, as empresas associadas à FIFA ficarão isentas de pagar impostos.

A lei de responsabilidade fiscal, que limita o endividamento, será flexibilizada para facilitar as obras destinadas ao Campeonato e às Olimpíadas. Como enfatiza o professor Carlos Vainer, especialista em planificação urbana, um município poderá endividar-se para construir um estádio, porém não para efetuar obras de saneamento…

A FIFA é um cassino. Num cassino muitos jogam, porém poucos ganham. E quem não perde nunca é o dono do cassino. Assim funciona a FIFA, que se interessa mais pela ganância que pelo esporte. Por isso, desembarca no Brasil com sua tropa de choque para obrigar o governo a esquecer leis e costumes.

A FIFA quer proibir, durante o campeonato, a comercialização de qualquer produto num raio de 2 km ao redor dos estádios. Exceto as mercadorias vendidas pelas empresas associadas a ela. Que fique bem claro: para o comércio local, portas fechadas; para camelôs e ambulantes, a polícia contra eles. Abram alas para a FIFA! Quase 170 mil pessoas serão removidas de suas casas para que sejam construídos estádios. E quem garante que serão devidamente indenizadas?

A FIFA quer o povo longe do Campeonato. Que se contentem acompanhando pela TV. Entrar nos estádios será privilégio da elite, dos estrangeiros e dos que possuem dinheiro para comprar entradas. Vale ressaltar que uma boa quantidade de entradas será vendida na Europa antecipadamente.

A FIFA quer impedir o direito à meia-entrada. Fora estudantes e idosos! E nada de entrar nos estádios com as empadinhas da vovó ou o lanche dietético recomendado pelo médico. Até a água será proibida.

Todos serão revistados na entrada. Só uma empresa de fast-food (lanchonete) poderá vender seus produtos nos estádios. E a proibição de bebidas alcoólicas nos estádios, que está em vigor no Brasil, será quebrada em prol de uma marca de cerveja produzida nos EUA.

O prestigioso jornal Le Monde Diplomatique comenta: “A celebração de um megaevento desportivo como este autoriza também a megaviolação de direitos, o megaendividamento público e as megairregularidades”.

A FIFA quer suspender, apenas durante o campeonato, a vigência do Estatuto do Torcedor, do Estatuto do Idoso e o do Código de Defesa do Consumidor. Todas essas propostas ilegais estão contidas no Projeto de Lei 2.330/2011, que se encontra em trâmite no Congresso. No caso de ser aprovado, o Governo poderá fazê-las efetivas através de medidas provisórias.

Se você quiser fazer uma camiseta com a frase “Copa 2014”, tenha cuidado. A FIFA está solicitando ao INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial) o registro de mais de mil títulos, entre os quais o numeral “2014”.

(Não) confiem numa desordem como esta: a FIFA quer instituir tribunais de exceção durante o campeonato. Sanções relacionadas com a venda de produtos e com o uso de ingressos e publicidade. No projeto de lei antes citado, o artigo 37 permite criar juizados especiais, grupos e câmaras especializadas para as causas relacionadas aos eventos. Uma justiça paralela!

Na África do Sul, foram criados 56 Tribunais Especiais do Campeonato. O roubo de uma câmera fotográfica foi sancionado com 15 anos de prisão! E pior ainda: caso gerassem danos e prejuízos para a FIFA, a culpa e a reparação dos mesmos ficariam a cargo do Estado. Ou seja, o Estado brasileiro passa a ser fiador da FIFA em seus negócios particulares.

Já e hora de os torcedores organizados e dos movimentos sociais colocarem a bola em jogo e mirarem o gol. Pressionar o Congresso e impedir a aprovação da lei que deixa a legislação brasileira no banco de reservas. Caso contrário, o torcedor brasileiro vai ter que se conformar em assistir aos jogos pela televisão.

domingo, 27 de novembro de 2011

A Arte e a Rua (Transformação!)



A arte e a rua

Sinopse:

Cidade Tiradentes, distrito no extremo Leste de São Paulo, lugar onde a cidade termina, ou começa. De lá, chegam rimas, gestos e cores que marcam o espaço, como street dance, grafite e rap. A experiência periférica urbana é a base e o motivo da produção dos artistas de Cidade Tiradentes, que cresceram junto com o distrito paulista e em suas obras dialogam com seus desafios e sonhos. O filme segue a vida e as transformações da arte de rua com a urbanização em Cidade Tiradentes. O lugar é considerado o maior complexo de conjuntos habitacionais populares da América Latina, marcado pela exclusão, no qual a população orquestra suas dificuldades com dinâmicas próprias de sociabilidade, moradia, e apropriação do território.

Ficha técnica:
Full HD, NTSC, cor, 46 min, 2011.
Direção, pesquisa e roteiro
Carolina Caffé e Rose Satiko Gitirana Hikiji
Montagem e Roteiro de montagem
Douglas Guedes e Karine Binaux
Direção de Fotografia
Rafael Nobre
Direção de handycam e produção local
Daniel Hylario

Produção: Laboratório de Imagem e Som em Antropologia (LISA-USP); Instituto Polis e W.S. Produções

Apoio: Etnodoc - Edital de Apoio a Documentários Etnográficos sobre Patrimônio Imaterial

Projetos de pesquisa
Cartovideografia Sociocultural da Cidade Tiradentes: www.cidadetiradentes.org.br
Realização: Instituto Pólis. Apoio: Centro Cultural da Espanha_SP
"Projeto Temático Antropologia da Performance: Drama, Estética e Ritual". Apoio: FAPESP.
Projeto temático "A experiência do filme na Antropologia". Apoio: FAPESP.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Entrevista com o rapper Fábio Emecê (eu mesmo!)

O jornalista Victor Viana (o Curinga de Búzios) agora está atuando como radialista abrindo espaço para ótimas entrevistas em seu programa semanal.

Dessa vez o convidado foi o rapper e professor Fábio Emecê, que versou sobre os dilemas da sociedade, sobre a importância do Hiphop na formação da identidade popular, guerra de classes, racismo e a luta pelo resgate da cultura em Cabo Frio.

Espero que o exemplo do Blogueiro Curinga de Búzios se espalhe por outras rádios e sejam promovidos vários debates em nossa Região abrindo espaço para que novas vozes sejam ouvidas.







terça-feira, 15 de novembro de 2011

Conversa com Joel Zito Araújo - posicionamento, estéticas e cinematografias

* Já tive aula com o cara!!


por Sumaya Machado Lima

joel zito 1Joel Zito Araújo é cineasta mineiro, ou baianeiro (como prefere se denominar, por ter nascido na fronteira entre os estados de Minas Gerais e Bahia). É realizador de obras sobre a questão das africanidades no Brasil. Seus filmes receberam os prêmios de maior relevância do cinema brasileiro: A Negação do Brasil (2001) recebeu prêmio de melhor filme no Festival Internacional de Documentários É Tudo Verdade/It's all true e de melhor roteiro no Festival de Recife em 2001; o ficcional As Filhas do Vento (2005) recebeu 8 kikitos no Festival de Gramado; e o documentário Cinderelas, lobos e um príncipe encantado (2009) recebeu, pela votação do público, prêmios de melhor filme e melhor diretor na 9ª edição do Festival Iberoamericano de Cinema de Sergipe. Joel Zito é também pesquisador, doutor em Ciências da comunicação pela Escola de Comunicações e Arte da Universidade de São Paulo – ECA/USP, Brasil e pós-doutor pelo departamento de rádio, TV e cinema e pelo departamento de antropologia da University of Texas, em Austin, nos Estados Unidos, tendo publicado os livros A Negação do Brasil – o negro na telenovela brasileira (2001), e O negro na TV pública (2010).

Por um lado, seus trabalhos possuem um forte cunho político, em favor de desconstruir a imagem eurocêntrica que a mídia brasileira insiste em construir. Por outro, a temática da afirmação de uma identidade diaspórica dos afrodescendentes é uma constante em suas obras, que contribuem para alicerçar um fenômeno social em expansão: a promoção de ações pelo reconhecimento da diversidade étnica nas culturas dos países latino-americanos, bem como o respeito às suas manifestações. Atualmente ele desenvolve projetos educativos e fílmicos com Angola e Cabo Verde. E produz uma série televisiva chamada "Nas trilhas da afro-diáspora" em parceria com a antropóloga norte-americana Sheila Walker, uma expert no assunto, reconhecida internacionalmente.

Na entrevista a seguir, comenta sua estética, seu posicionamento político e correlaciona o universo acadêmico e o cinematográfico em suas experiências.

joel zito2De que maneira, ou maneiras, a experiência da investigação acadêmica (você é Doutor em Comunicação pela ECA/USP) se relaciona com as suas atividades de cineasta e roteirista?

O desejo de fazer cinema chegou primeiro na minha vida. Os filmes de cineastas como Frederico Fellini, Michelangelo Antonioni e François Traffaut (entre outros nessa linha autoral) abriram essa janela no meu horizonte, no final da minha adolescência. Na faculdade, começando na psicologia, mas desde aí me encantando pela Antropologia e Ciências Sociais. Eu comecei a me interessar pela investigação. Mas, acabei entrando no cinema pela porta mais investigativa, pelo documentário. Na realidade, a maior diferença entre a investigação acadêmica e o documentário (do jeito que faço) é que um necessita de uma câmera como instrumento principal de trabalho. Portanto, somente o cinema ficcional é que demanda uma atitude diferente. Mas, mesmo assim, me sinto permanentemente investigando para a ficção, quando nos lugares públicos e privados, eu observo as pessoas e escuto conversas alheias, como potenciais personagens ou potenciais diálogos e atitudes para futuros filmes.

Na sequência formada pelas obras A negação do Brasil (2000), As filhas do vento (2005) e De Cinderelas, Lobos e um príncipe encantado (2009), vislumbramos, entre outros aspectos, a abordagem de temas relacionados às interpretações que a sociedade brasileira estabeleceu do sujeito negro e de suas práticas culturais. Esse conjunto de obras nos permite falar da existência de um projeto estético e ideológico articulado pelo criador Joel Zito Araújo?

Totalmente. Uma estética e dramaturgia negras são partes do meu grande objeto. Eu gostaria de evoluir para uma postura menos ideológica, menos comprometida com as bandeiras dos "companheiros de viagem do movimento negro". Mas ainda sou muito atento às suas queixas e demandas. E elas tendem a refletir ou encontrar acolhida especialmente no meu cinema documental. Mas os meus próximos projetos ficcionais estão mais soltos, longe de pautas ou temas do momento. Na realidade, nunca me inspirei em pauta de ninguém, mas acabei as trazendo para os meus filmes sem nenhuma intenção inicial, sem nenhum planejamento.

O que seriam pautas ou temas do momento?

As decisões tomadas em Congressos, em reuniões da liderança. Os temas que são consensuais e tornam-se campanhas públicas. Exemplo, a luta com a esterilização de mulheres negras. Mas tenho um projeto estético de criar cada vez mais histórias que estejam, de alguma forma, ligadas à história e à cultura afrodescendente, e à estética e à dramaturgia que se escondem na mitologia dos orixás. Acho que temos um universo rico, pouco trabalhado no cinema brasileiro. Por outro lado, considero que a cultura brasileira traz, dentro de si, especialmente no seu comportamento afetivo e sexual uma enorme herança africana e indígena. Ou se vive da influência ou se vive da recusa, mas consciente ou inconscientemente estamos sempre relacionados a essa herança. Trazer isso para os filmes é uma tarefa que considero fascinante.

joel zito 3

O governo brasileiro tem estimulado o estreitamento da relação entre Brasil e África, especialmente com países africanos de língua portuguesa. Como um representante da ABRACI (Associação Brasileira de Cinema) no Rio de Janeiro, você acha que já é possível avaliar esses laços e seus desdobramentos na cinematografia? Isto é, tem havido trocas de nível técnico, intelectual e é possível vislumbrar co-produções?

As minhas avaliações sobre as relações Brasil e África na cinematografia estão mais relacionadas com o meu interesse pela negritude, com a valorização de nossas raízes africanas, que são parte de minha obra, do que com os meus cargos e participação na ABRACI. De um modo geral, os nossos cineastas foram formados pela ideologia, segundo a qual somos uma democracia racial, e pelos subtextos que ela traz, especialmente a idéia que já "superamos" o passado "primitivo" africano, pois somos um povo novo e miscigenado (em direção ao ocidente, ao branqueamento). Portanto, vejo pouco interesse entre meus pares pela África. Com exceção do passado recente, nas lutas pela independência, anti-colonialistas, de Angola, Moçambique, Guiné-Bissau e de Cabo Verde. Houve várias cineastas que foram para lá e filmaram momentos importantes dessa luta. Mas, entendo que esse interesse veio de uma coincidência entre uma plataforma da esquerda mundial com as lutas independentistas. Infelizmente, Karl Marx e Engels, em grande parte de sua obra comum, foram preconceituosos com os povos dito primitivos, atrasados. Eles chegaram a defender a escravidão nos Estados Unidos como uma etapa necessária para o avanço da história em direção ao socialismo. Eles ignoraram as revoltas negras no seu tempo, no Brasil e no Haiti. As consequências desse tipo de pensamento foi provocar o desinteresse da maioria dos nossos historiadores, sociólogos e artistas, com formação de esquerda, pela África, pela população indígena brasileira, pela Amazônia (antes da onda ecológica). Portanto, depois da fase de ajuda aos grupos de esquerda que lideraram a independência, as trocas recomeçaram recentemente, e eu sou um dos poucos que apostam nisso, que se esforça por intercâmbios técnicos para reafirmar nossos laços de herança. A exemplo do curso de especialização em cinema que estou montando com o cineasta e artista plástico cabo-verdiano, Leão Lopes, para começar no segundo semestre deste ano em Mindelo, capital da ilha de São Vicente. As co-produções também estão em curso, e participo deste interesse em realizar filmes na África ou com africanos, em várias frentes, desde 2005.

Pode-se dizer que as críticas à sociedade brasileira, implícitas na análise da exclusão dos afrodescendentes da teledramaturgia (vide o documentário A negação do Brasil), fundamentam o seu modo de selecionar e dirigir os seus filmes?

Elas influenciaram muito diretamente em As filhas do vento, mas não sei o quanto elas estão influenciando os novos projetos. Mas, a questão básica que está no filme e livro A negação do Brasil com certeza sempre fundamentará os meus trabalhos. Ou seja, é um paradigma para o presente e para o futuro, dar visibilidade para a nossa diversidade racial e desconstruir a ideologia do branqueamento. E isso é feito na atitude simples de valorizar o personagem negro como um brasileiro comum, e não como estereótipo de si mesmo.

O documentário A negação do Brasil contribuiu de maneira efetiva para análise de alguns temas tabus da teledramaturgia brasileira, especialmente o tema da subalternidade dos personagens afrodescendentes. Como você avalia o modo de representação desses personagens, levando em conta as novelas brasileiras da última década?

As novelas estão evoluindo para a incorporação do ator negro em personagens fora das marcas da subalternidade. É uma postura conflituosa, uma vez que os autores e diretores não querem admitir publicamente que estão dando o "braço a torcer", e eles (ou seus antecedentes) por quase quarenta anos trataram o negro como um ser subalterno, nascido para servir, para representar a feiúra, a inferioridade social e humana. A cada passo positivo que eles dão como, por exemplo, ao criar uma Helena negra, fazem questão de reiterar publicamente, em suas afirmativas para a imprensa que não consideraram a raça da atriz, mas o seu talento, na hora de definir quem seria a escolhida para o papel. Como se Ruth de Souza, Léa Garcia, Zezé Motta e Milton Gonçalves não fossem desde jovens os atores super-talentosos que conhecemos. E, nem por isso, foram escalados para serem protagonistas de qualquer novela ou minissérie.

Considerando a sua atuação nos debates sobre as relações étnico-sociais no Brasil e a repercussão de sua obra junto a uma parcela expressiva de afrodescendentes, de que modo você articula a sua autonomia autoral com a possibilidade de tornar-se o representante de uma coletividade étnica e socialmente reconhecida, ou seja, os afrodescendentes?

Eu nunca tive o desejo de ser representante dos afrodescendentes. Sempre fui um companheiro de viagem. Abraço qualquer causa que me pareça justa e, por razões midiáticas, só aparece o que falo sobre a questão racial. Mas dou minha opinião como cidadão contra aquilo que condeno e que julgo necessitar da atenção pública ou de uma opinião pública favorável. Uso a simpatia e respeito que o público tem pelo meu trabalho como uma forma de auxiliar os movimentos sociais em causas que considero fundamentais. Eu sou e sempre fui uma pessoa engajada no mundo em que vivo. Reajo a injustiças, estupidez e desinformação. Mas, nunca desejei e nem desejo ser representante político, institucional ou de qualquer outra forma da população afrodescendente. Não sou candidato a nada. Os meus filmes também são cheios de críticas dirigidas para dentro da comunidade negra. Por exemplo, as dificuldades do homem negro em respeitar a mulher negra são temas constantemente tratados no meu trabalho. Portanto, a minha autonomia autoral e intelectual vêm em primeiro lugar.

joel zito 4

Em As filhas do vento, embora as luzes não estejam projetadas exclusivamente sobre os temas da afrodescendência (questões de etnia) e da experiência social do feminino (questões de gênero), o fato é que temos um enredo no qual as mulheres negras atuam de maneira destacada. Você poderia nos dizer como conjugou estes elementos durante a montagem do filme?

Esses elementos começaram a ser conjugados desde a concepção do filme. Na realidade, eles nasceram de uma convivência muito rica e afetiva com as atrizes que deram os seus depoimentos para A negação do Brasil. Especialmente Ruth de Souza, Léa Garcia e Maria Ceiça. As histórias que ouvi articularam-se com a história da minha mãe (que é um outro elemento de inspiração no filme). A minha mãe está em Ju, e um pouco também na Selminha. Mas, creio que, na montagem, esse processo pesou pouco. Os momentos fundamentais foram no desenvolvimento do argumento e do roteiro, e no trabalho de preparação dos atores. Quando ouvi os diálogos na boca dos atores compreendi melhor os nossos personagens e produzi várias mudanças no texto, e até mesmo no final da história.

Então filhas teria outro desfecho. Qual teria sido?

No tratamento de roteiro que antecedeu a preparação dos atores não existia a cena final dentro da igreja, a conversa entre as duas irmãs no mesmo ambiente de abertura do filme. O desfecho dramático acontecia naquela noite chuvosa dentro da casa do pai. Elas diziam todas as verdades e ressentimentos que guardavam por décadas e, depois de cansadas de tanta briga, Ju tomava a iniciativa de reconciliar chamando a Cida para brincar na água da chuva, da mesma forma que chamou para brincar na lagoa no início do filme. Seria uma passagem mais mágica, mais romântica. Essa cena aparece depois de começar a subir os créditos. No entanto, sentimos que a discussão era muito desgastante, que não dava clima para recomposição. Sentimos que o filme perderia muito se tentássemos introduzir a cena da água bruscamente depois de uma briga muito dura. Esse tipo de briga entre irmãs é como briga de casal, depois da tempestade existe uma pausa, e somente depois surge um momento de conversa tranquila. Ou seja, demanda-se um certo tempo. E é aí que existe a possibilidade do casal ser sensato, e cada um assumir seus erros. Daí foi que decidimos também que o acerto de contas não deveria ser entre todas as mulheres, mas somente entre as duas, e na igreja. Ali, no mesmo ambiente do primeiro reencontro, cena inicial do filme, elas teriam a chance de fazer uma tentativa final de reconciliação, numa conversa sensata, justa. E elas não iriam mais uma vez perder a oportunidade de redenção.

E por que naquela igreja? Algum outro motivo, além de ter sido o local do reencontro?

A igreja é um lugar altamente simbólico para o contexto racial do filme. Em "Filhas" falo especialmente de uma espécie distinta de grupo étnico negro do Brasil, diferente de Salvador e Rio, os negros mineiros têm seu comportamento baseado no afro-catolicismo. Essa devoção aos santos católicos, especialmente aos santos negros, e o sufocamento sobre a origem e os mitos dos orixás marcaram Minas Gerais e os negros mineiros. Portanto, a igreja é mais que um cenário, ou um retorno que o filme dá em seu final para o seu ponto de partida, é um fechar a estória em um mesmo espaço cultural e religioso que define grande parte dos seus conflitos.

Nota-se um jogo do que é ficção e fato nAs filhas. Poderia comentar o significado desse jogo?

O filme está cheio de fatos misturados ao ficcional. A ladainha inicial cantada na igreja é uma tradição da comunidade para os seus mortos, que ao tomar conhecimento, incorporei rapidamente no filme. Aliás, abre o filme. Existe uma placa de estrada, que vemos na encruzilhada quando Cida está retornando à sua cidade natal, e dá direções para lugares importantes de minha vida em Minas Gerais, especialmente para a vila que nasci, Lagedão, distante cerca de mil quilômetros das duas outras cidades citadas. Ou seja, Cida retorna para o seu torrão natal, e passa por um ponto que indica que o diretor também tem uma possibilidade de voltar ao seu torrão. Há uma placa de sinalização criada pela direção de arte, a meu pedido. Os poemas de Dorinha aparecem como se fossem parte do livro "Cadernos Negros", criado por um grupo de poetas e escritores de São Paulo, e grandes amigos, que me convidaram para prefaciar uma de suas edições. Dorinha usa as poesias da amiga Elisa Lucinda como se fossem suas. E, por fim, faço vários jogos com a vida real de Ruth de Souza, usando as fotos de sua carreira nas paredes de sua casa, usando trechos de novelas reais que participou, e que são mostradas como se fossem atuações de sua personagem.

filhas do ventoMaria Ceiça, Ruth de Souza e Danielle Ornelas, em 'Filhas do Vento'

Ruth de Souza e Léa Garcia são nomes emblemáticos da dramaturgia brasileira e, particularmente, daquela vertente relacionada às questões da afrodescendência. A participação que ambas tiveram no TEN – Teatro Experimental do Negro, dirigido por Abdias do Nascimento pertence, hoje, à história do teatro brasileiro e da luta contra a discriminação racial e social. A escolha dessas atrizes como protagonistas do filme, para além de sua competência profissional, tem algum outro significado?

A história da Ruth de Souza foi a mais forte fonte de inspiração do filme. No desenvolvimento do argumento cheguei até mesmo a flertar com a possibilidade de fazer um filme autobiográfico, mas acabei desistindo da idéia. Seria muito difícil trazer histórias de pessoas que estão vivas e continuam se relacionando, e mantendo mágoas e resquícios dos amores do passado. A influência da Léa surgiu depois, ao conhecer melhor as duas e observar como se dava a irmandade e o conflito entre elas. Ruth e Léa são duas mulheres fascinantes e quase totalmente diferentes. Elas trocam telefonemas toda semana. Compartilham o mundo e discutem muito entre si, em decorrência de suas diferenças de personalidade. São irmãs de alma e meio antíteses entre si. E, na intimidade que passei a ter com elas, desde que ficaram encantadas com o meu filme e livro A Negação do Brasil, eu pude observar a Cida e a Ju escondidas dentro delas. Digamos que o meu trabalho foi revelar isso.

Se em Ruth de Souza e Léa Garcia temos o reconhecimento da consagração de uma geração de atrizes negras pioneiras, o que se pode considerar a partir do protagonismo de atrizes mais jovens como Taís Araújo, Thalma de Freitas e Daniele Ornellas?

Essas três da nova geração participam de um mundo diferente daquele que Ruth e Léa viveram em suas juventudes. Hoje o Brasil discute a questão racial, diferente da juventude delas, quando o mito de que éramos uma democracia racial e que, portanto, não existia o problema racial era muito mais forte e sufocava tudo. Era uma barreira que negou muitas possibilidades para elas. Taís, Thalma e Daniele vivem em um mundo com barreiras bem menores.

joel zito5

Em As filhas do vento, a passagem do tempo é simbolizada pela inserção de duas novas personagens Dorinha (Danielle Ornella) e Selminha (Maria Ceiça), seguidas das personagens Ju (Léa Garcia) e Cida (Ruth de Souza) em fase adulta. Você poderia comentar a sua intenção nessa sequência, a ordem de aparecimento das personagens, o uso dos filtros e a sua figuração/conotação sexual?

Nós não usamos filtros na cena dos gozos. Aquilo é resultado do cenário, do figurino e da luz. Mas, a intenção quando elaborei essa sequência foi criar uma situação de impacto que levasse o espectador diretamente para aquelas mulheres negras na plenitude de suas vidas adultas. E o que podemos ter com mais plenitude nessa altura de nossas vidas? A sexualidade. A cena dos gozos tentava tirar o espectador daquele universo bucólico e reprimido de uma cidadezinha do interior de Minas e levar para um mundo diferente em que aquelas mulheres tornaram-se donas dos seus gozos, de suas sexualidades e tentavam ser donas de suas vidas afetivas. E desfrutavam disso cada uma à sua maneira. E o jeito de gozar já tentava levar para o público os dramas ou o traço da personalidade de cada uma delas: alegria, angústia, solidão e paz. A alegria de Dorinha, a angústia da Selminha, a solidão de Cida e a paz e maturidade sexual do casal Ju e Marquinhos. Foi, propositalmente, uma cena de impacto para jogar do bucólico para o drama no tempo atual daquelas mulheres. Aqui cabe um parêntese, o roteiro foi um trabalho de quatro mãos, com o Di Moretti, mas essa cena foi uma criação minha.

Seu documentário de 2009, Cinderelas, Lobos e um Príncipe Encantado, revela o imaginário coletivo a respeito do desempenho sexual das mulheres brasileiras, especialmente das mulheres negras. De alguma forma, houve a intenção de representar este imaginário também nesta sequência ficcional?

Sim, creio que até no passado recente tínhamos uma diferença marcante entre o imaginário sexual das mulheres negras e das brancas brasileiras. Tomo como exemplo a minha mãe negra e as minhas tias da linhagem paterna, branca. Quando minha mãe se separou no final dos anos 50, ela teve várias relações amorosas e sexuais. E isto era absolutamente natural para ela. Foi feito sem culpas. As minhas tias se separaram no final dos anos sessenta e nunca mais voltaram a ter relações sexuais. Os únicos homens de suas vidas foram os maridos. Elas bloquearam novas possibilidades, correspondendo às expectativas de suas famílias e de seu grupo social/racial. Acho que este exemplo espelha a moralidade "branca" e a diferença com o universo da mulher negra brasileira, que desde o tempo da escravidão foi até mesmo proibida de ter o "seu homem". O senhor de escravos não apenas se dava ao direito de dispor do corpo das mulheres negras, como definia se elas podiam ter vínculos familiares ou não, ou com quem deviam procriar. A tudo isso se associa o panteão mitológico das religiões dos orixás que, assim como os tipos psicológicos definidos por algumas correntes da psicologia, enxergam as possibilidades de cada ser humano ter comportamentos muito diferenciados um dos outros. Não somos apenas homem ou mulher. Ou homem, mulher e um "terceiro sexo". Temos uma possibilidade muito grande de constituir tipos psicológicos, sexuais e afetivos extremamente distintos, a partir dos orixás que determinam a nossa cabeça, ou que influenciam nosso destino. Se você é uma filha de Iansã tende a ser uma pessoa direta no que quer, não esconde sentimentos de ninguém. Tende a ser muito mulher, mãezona e sensual, e também a ter períodos ou ciclos de certa ambivalência sexual, de ser mulher em certas horas e meio masculina em outras. Mas se você for ver as características de Oxum encontrará um jeito humano de ser muito distinto de Iansã ou de Nanã. Enfim, quem nasce ou cresce, mesmo que indiretamente, sobre o manto imaginário dos orixás compreende a si mesmo e sua sexualidade de forma muito distinta do imaginário branco cristão europeu. As cenas dos gozos, que faz a passagem do passado para o presente no filme, é uma intenção de representar essas diferenças humanas e, ao mesmo tempo, mostrar a importância da sexualidade para aquelas mulheres.

cinderellas1Cinderelas, lobos e um príncipe encantado (2009)

Nas cenas do velório do pai vemos, em determinado momento, a participação de um Terno de Congada no cortejo fúnebre. Fale-nos sobre o processo de inserção dessa experiência religiosa popular no contexto do filme. Você tinha, ou tem alguma expectativa especial em relação à recepção desse processo?

Eu acredito que, à medida que assumimos nossas raízes, nossas heranças familiares, comunitárias e históricas, tendemos a ser mais seguros e resolvidos. O personagem do Zé das Bicicletas é de um negro correto, mas angustiado com o seu papel de demonstrar o tempo todo que não vai ameaçar as relações raciais, que vai cumprir o que é esperado para ele na sociedade mineira e brasileira. No entanto, suas filhas o fazem pensar. Tem um hiato de tempo que não sabemos o que aconteceu com ele. Mas ele envelhece e torna-se mais doce. E a sua participação na Congada é a experiência que ajuda no processo de ter orgulho de sua negritude. A incorporação daquele ritual típico da Congada no enterro de uma pessoa com uma posição destacada em sua hierarquia tenta passar para o público essa mudança na história do pai. Eu me preocupei também em trazer para a ficção o universo do afrocatolicismo que é a marca da experiência negra diaspórica de Minas Gerais e da região oeste do país. O negro baiano do recôncavo é ligado aos orixás. O negro carioca é ligado também aos orixás e ao panteão mais miscigenado da Umbanda. O cinema ficcional brasileiro nunca prestou atenção ao universo do afrocatolicismo. Com As filhas do vento, tive a chance de trazer um pouquinho dessa percepção para os espectadores.

A inclusão de um texto poético no discurso da personagem, ao final de As filhas do vento, aponta para algo mais que um diálogo entre o seu filme e a tendência politicamente engajada da Literatura Afro-brasileira contemporânea? Por que você selecionou estes poemas para ecoarem na voz da personagem?

Os poetas negros paulistanos, especialmente Arnaldo Xavier, foram importantes na minha formação intelectual. E amo as poesias modernas da Elisa Lucinda, amiga de quase duas décadas. Como já disse, sua poesia está na boca da personagem Dorinha, Elisa me inspirou na criação dessa personagem. Eu até mesmo tentei trazê-la para o filme, mas sua agenda com a Rede Globo não permitiu.

A cena em que Ju aparece salvando as crianças, é uma das partes mais dinâmicas do filme, considerando a música e a movimentação de câmeras. Por não ser um filme blockbuster dá a impressão de que foi algo um pouco difícil de fazer e de montar. Além disso, pareceu extraordinário que uma mulher daquela idade salvasse tantas crianças sozinha. Poderia comentar a construção desta sequência e a opção por inseri-la?

Realmente, o meu filme é um melodrama. Não é um thriller, e não tinha orçamento para ser rodado como um filme de ação que demanda mais câmeras, mais filmagens, mais aparatos, mais dinheiro. Mas a minha inexperiência me fez tentar. O resultado é pobre, é a parte que menos gosto do filme, do ponto de vista da realização. No entanto, a inspiração da cena é uma história familiar muito marcante no meu segmento paterno. A irmã do meu pai, a querida tia Dulce, enfartou e morreu depois de salvar os seus netos do afogamento, assim como Ju faz no filme. Esse drama real surgiu, quando eu tentava criar uma cena que mostrasse as diferenças de personalidade da personagem Ju, no segundo momento do filme. Na primeira parte, o público conheceu uma garota mimada, coquete, meio irresponsável. E eu queria levar o filme para o confronto de duas irmãs, de duas mulheres na terceira idade, que aprenderam com a vida, que se tornaram mulheres interessantes. Uma, mãezona e a outra, uma artista famosa, reconhecida nacionalmente. O seu heroísmo, ao salvar os seus netos do afogamento, teve a intenção de mostrar essa mulher mãezona responsável, comprometida com sua prole e com traços de culpa em relação ao incidente que levou à "expulsão" de sua irmã querida. É por isso que na mesma sequência ela tem aquele diálogo sobre a sua decisão de não casar-se com Marquinhos. A história real caiu, portanto, como uma luva para buscar transformar os sentimentos do espectador em relação àquela jovem coquete do passado.

Fonte: Buala



segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Eu, o SUS, a ironia e o mau gosto


Por Nina Crintzs


Há seis anos atrás eu tive uma dor no olho. Só que a dor no olho era, na verdade, no nervo ótico, que faz parte do sistema nervoso. O meu nervo ótico estava inflamado, e era uma inflamação característica de um processo desmielinizante. Mais tarde eu descobri que a mielina é uma camada de gordura que envolve as células nervosas e que é responsável por passar os estímulos elétricos de uma célula para a outra. Eu descobri também que esta inflamação era causada pelo meu próprio sistema imunológico que, inexplicavelmente, passou a identificar a mielina como um corpo estranho e começou a atacá-la. Em poucas palavras: eu descobri, em detalhes, como se dá uma doença-auto imune no sistema nervoso central. Esta, específica, chama-se Esclerose Múltipla. É o que eu tenho. Há seis anos.

Os médicos sabem tudo sobre o coração e quase nada sobre o cérebro – na minha humilde opinião. Ninguém sabe dizer porque a Esclerose Múltipla se manifesta. Não é uma doença genética. Não tem a ver com estilo de vida, hábitos, vícios. Sabe-se, por mera observação estatística, que mulheres jovens e caucasianas estão mais propensas a desenvolver a doença. Eu tinha 26 anos. Right on target.

Mil médicos diferentes passaram pela minha vida desde então. Uma via crucis de perguntas sem respostas. O plano de saúde, caro, pago religiosamente desde sempre, não cobria os especialistas mais especialistas que os outros. Fui em todos – TODOS – os neurologistas famosos – sim, porque tem disso, médico famoso – e, um por um, eles viam meus exames, confirmavam o diagnóstico, discutiam os mesmos tratamentos e confirmavam que cura, não tem. Minha mãe é uma heroína – mãos dadas comigo o tempo todo, segurando para não chorar. Ela mesma mais destruída do que eu. E os médicos famosos viam os resultados das ressonâncias magnéticas feitas com prata contra seus quadros de luz – mas não olhavam para mim. Alguns dos exames são medievais: agulhas espetadas pelo corpo, eletrodos no córtex cerebral, “estímulos” elétricos para ver se a partes do corpo respondem. Partes do corpo. Pastas e mais pastas sobre mesas com tampos de vidro. Colunas, crânio, córneas. Nos meus olhos, mesmo, ninguém olhava.

O diagnóstico de uma doença grave e incurável é um abismo no qual você é empurrado sem aviso. E sem pára-quedas. E se você ta esperando um “mas” aqui, sinto lhe informar, não tem. Não no meu caso. Não teve revelação divina. Não teve fé súbita em alguma coisa maior. Não teve uma compreensão mais apurada das dores do mundo. O que dá, assim, de cara, é raiva. Porque a vida já caminha na beirada do insuportável sem essa foice tão perto do pescoço. Porque já é suficientemente difícil estar vivo sem esta sentença se morte lenta e degradante. Dá vontade de acreditar em Deus, sim, mas só se for para encher Ele de porrada.

O problema é que uma raiva desse tamanho cansa, e o tempo passa. A minha doença não me define, porque eu não deixo. Ela gostaria muitíssimo de fazê-lo, mas eu não deixo. Fiz um combinado comigo mesma: essa merda vai ter 30% da atenção que ela demanda. Não mais do que isso. E segue o baile. Mas segue diferente, confesso. Segue com menos energia e mais remédios. Segue com dias bons e dias ruins – e inescapáveis internações hospitalares.

A neurologista que me acompanha foi escolhida a dedo: ela tem exatamente a minha idade, olha nos meus olhos durante as minhas consultas, só ri das minhas piadas boas e já me respondeu “eu não sei” mais de uma vez. Eu acho genial um médico que diz “eu não sei, vou pesquisar”. Eu não troco a minha neurologista por figurão nenhum.

O meu tratamento custaria algo em torno de R$12.000,00 por mês. Isso mesmo: 12 mil reais. “Custaria” porque eu recebo os remédios pelo SUS. Sabe o SUS?! O Sistema Único de Saúde? Aquele lugar nefasto para onde as pessoas econômica e socialmente privilegiadas estão fazendo piada e mandando o ex-presidente Lula ir se tratar do recém descoberto câncer? Pois é, o Brasil é o único país do mundo que distribui gratuitamente o tratamento que eu faço para Esclerose Múltipla. Atenção: o ÚNICO. Se isso implica em uma carga tributária pesada, eu pago o imposto. Eu e as outras 30.000 pessoas que tem o mesmo problema que eu. É pouca gente? Não vale a pena? Todos os remédios para doenças incuráveis no Brasil são distribuídos pelo SUS. E não, corrupção não é exclusividade do Brasil.

O maior especialista em Esclerose Múltipla do Brasil atende no HC, que é do SUS, num ambulatório especial para a doença. De graça, ou melhor, pago pelos impostos que a gente reclama em pagar. Uma vez a cada seis meses, eu me consulto com ele. É no HC que eu pego minhas receitas – para o tratamento propriamente dito e para os remédios que uso para lidar com os efeitos colaterais desse tratamento, que também me são entregues pelo SUS. O que me custaria fácil uns outros R$2.000,00.

Eu acredito em poucas coisas nessa vida. Tenho certeza de que o mundo não é justo, mas é irônico. E também sei que só o humor salva. Mas a única pessoa que pode fazer piada com a minha desgraça sou eu – e faço com regularidade. Afinal, uma doença auto-imune é o cúmulo da auto-sabotagem.

Mas attention shoppers: fazer piada com a tragédia alheia não é humor, é mau gosto. É, talvez, falha de caráter. E falar do que não se conhece é coisa de gente burra. Se você nunca pisou no SUS – se a TV Globo é a referência mais próxima que você tem da saúde pública nacional, talvez esse não seja exatamente o melhor assunto para o seu, digamos, “humor”.

Quem me conhece sabe que eu não voto – não voto nem justifico. Pago lá minha multa de três reais e tals depois de cada eleição porque me nego a ser obrigada a votar. O sistema público de saúde está longe de ser o ideal. E eu adoraria não saber tanto dele quanto sei. O mundo, meus amigos, é mesmo uma merda. Mas nós estamos todos juntos nele, não tem jeito. E é bom lembrar: a ironia é uma certeza. Não comemora a desgraça do amiguinho, não.

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

Um Passinho em direção a libertação do corpo

Um texto legal do João Xavi sobre o Funk Carioca


Um Passinho em direção a libertação do corpo Masculino

Publiquei aqui há pouco um texto sobre os Passinhos, novo fenômeno do Funk Carioca. Na ocasião apresentei de forma bem livre um histórico da Cultura Funk no Rio e algumas das novidades estéticas que o Passinho acrescenta em direção à renovação desta expressão artística. Desde então, venho assistindo com mais freqüência alguns dos milhares de vídeos com passinhos disponíveis no Youtube e em certo momento, como num estalo, foi impossível não pensar em alguns escritos de gente como Numa Ciro e Luiz Eduardo Soares. Os dois autores já se dedicaram a reflexões sobre cultura periférica: Numa pelo viés da psicologia, Soares pensando a segurança pública. Mas, curiosamente, ambos também realizaram abordagens pela chave do gênero. Em suma, do papel que estas culturas têm em relação ao aspecto masculino dos indivíduos com elas envolvidos.

Um dos aspectos que mais chama atenção nos Passinhos é a predominância masculina. São pouquíssimas as meninas que se arriscam nesta categoria de dança. Parto aqui novamente de uma análise baseada na minha experiência pessoal nos bailes dos anos 90 para problematizar mais uma das novidades trazidas pelos atuais dançarinos do Funk. Quando observamos o comportamento masculino mais recorrente nas duas décadas passadas percebemos a postura de um corpo mais rígido, que dança sim, mas que se movimenta limitado por estar amarrado à necessidade de expor-se como homem macho. Até então, a dança recheada de volúpia e a insinuação sensual era um papel exclusivo da mulher (com exceção da saudosa Lacraia).

São os movimentos dos Passinhos, com seus braços, giros e requebrados que estão fazendo afirmações do tipo “homem que é homem não rebola” cair por terra. Os próprios dançarinos dos Passinhos colocam a maior aproximação com as meninas como uma dos principais motivações para dançar. São estes movimentos que os tornam conhecidos, importantes e desejados pelas meninas. É desta forma que o Passinho resignifica a atitude do corpo masculino no contexto da Cultura Funk e, por conseqüência, no cotidiano da vida periférica carioca e brasileira. Libertando e ampliando as possibilidades de expressão corpórea de homens e meninos inseridos em uma cultura machista altamente repressora.

A dança nos Passinhos constrói ainda, de certa forma, uma situação andrógena já que os passos contém uma sensualidade que não se coloca presa a um gênero específico. A maioria dos dançarinos são meninos, mas meninas também podem dançar, e os passos são os mesmos. São movimentos que, bem da verdade e em seu teor sensual, eram até então exclusivos do universo feminino e que vão sendo pouco a pouco deflagrados pelo desejo dos homens de explorarem o próprio corpo de uma maneira nova, diferente e sempre motivada pela criatividade e invenção.

Por fim, creio que seja importante um tipo de reflexão sobre o Funk que o observe além dos clichês da violência, droga, sexualização e machismo. Para perceber a pluralidade de um objeto é preciso também encará-lo dispondo de um leque de questões mais amplas. Só assim é possível vislumbrar a idéia de que o Funk caminha devagarzinho, no ritmo do Passinho, sem muita teoria ou rancores ideológicos em direção a uma nova concepção do corpo masculino.

segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Podcast 13 - Poemas da Juh de Paula




Bloco 1


Emicida - Cacariacô
Bebeto - A Beleza é Você, Menina
Fátima Feat Floating Points - Mind


Bloco 2

Tune Yards - Bizness
Mariana Aydar - Solitude
Anelis Assumpção - Sonhando


Bloco 3

Gilsão Afronto - Terreiro
Anti - Éticos - Nós por Nós
Nneka - Sleep feat Ms Dynamite


Bloco 4

Xis - Sonho Meu
Seu Jorge - Quem não quer, sou eu
Oddisee - Still Doing feat YU


domingo, 30 de outubro de 2011

Ser ou não ser



Vou fazer o que?

Ela sente saudade de você

Vou sentir

Vou chorar

Vou gritar

Vou fazer o que?

Quando ligo, o tel tá ocupado por causa de você

Vou sentir

Vou chorar

Vou gritar

Vou fazer o que?

Quando mando mensagem, ela não retorna, pois ela já mandou pra você

Vou sentir

Vou chorar

Vou gritar

Vou fazer o que?

Ela não goza mais comigo, goza com você

Vou sentir

Vou chorar

Vou gritar

Vou fazer o que?

Eu não sou o poeta, o poeta é você

Vou sentir

Vou chorar

Vou gritar

Vou fazer o que?

O espaço é seu, vou fazer o que?

Vou sentir

Vou chorar

Vou gritar

Vou desaparecer...

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Weiwei, profissão artista-ativista



Por que a obra e a militância do maior artista chinês da atualidade são tão importantes para entendermos nossa relação com a arte (e a política) nos dias de hoje?






A prisão do artista chinês Ai Weiwei em abril causou uma comoção global que há tempos não se via em torno de um artista. Weiwei foi detido pela polícia chinesa quando embarcava de Pequim para Hong Kong e ficou sob a custódia de soldados por 81 dias. Nesse período, ninguém soube de seu paradeiro, até ser libertado em junho. A captura de Weiwei gerou protestos e manifestações pelo mundo. Museus renomados como o Guggenheim de Nova York e a Tate Modern de Londres emitiram comunicados pedindo sua libertação. Nas ruas de grandes cidades como Berlim, Dresden, Copenhague, Barcelona, pichações perguntavam "Where is Weiwei?" (Onde está Weiwei?). Sites, blogs e um perfil no Facebook foram criados para dar informações sobre seu confinamento. Organizações que lutam pelos direitos humanos fizeram petições em prol do artista.

Tal repercussão mostra sua relevância para a atual cena artística e traz luz justamente para esse caráter político da arte, que permite abrir uma fenda nova nas nossas perspectivas e padrões, e que nos afeta de forma a podermos nos mover e nos transformar. A arte, afinal, pode ser produtora de uma visão de mundo que, em potência, transforma a realidade - inclusive de um país. No caso de Weiwei essa relação entre arte e política está muito mais intrínseca. "Não dá para separar no trabalho dele o que é arte e o que é ativismo", afirma Moacir dos Anjos, que foi curador da 29ª Bienal de São Paulo, realizada no ano passado, e que reproduziu a obra Círculo de Animais do artista chinês. "As obras de Weiwei são baseadas em ações de choque que visam criticar o regime opressor chinês, portanto seu trabalho tem uma enorme conotação política", diz. Do lado mais ativista, ele é um fervoroso crítico do governo comunista chinês, condenando abertamente a falta de liberdade de expressão e de direitos humanos em seu país. Depois de ter sido solto, Weiwei prometeu ao governo se calar em troca da liberdade.

BUSCA DA TRADIÇÃO
A relação com as artes começou dentro de casa. Filho de um dos mais renomados poetas modernos da China, Weiwei nasceu em Pequim, em 1957, e se tornou artista, arquiteto, fotógrafo e curador. Suas obras denotam um artista eclético ao reunirem instalações, pinturas, filmes, fotografias e até performances - como a que organizou para a edição de 2007 da Documenta, em Kassel, em que levou 1.001 chineses que nunca haviam viajado para o exterior para morar na cidade alemã durante a mostra. Mas esteticamente ele investiu, com maior notoriedade, no campo das esculturas, construindo estruturas de forte valor simbólico. "Suas obras têm uma grande riqueza, robustez artística e formal, além de um aspecto estético muito apurado", analisa Dos Santos. Um dos exemplos é uma de suas obras que usou mochilas estudantis para representar crianças mortas em um terremoto na província de Sichuan em 2008, enfileiradas em uma estrutura suspensa e curvilínea denominada Snake (segundo Weiwei, as crianças só morreram no tremor porque as escolas foram construídas pelo governo com materiais pouco resistentes e de baixo custo; ele chegou a elaborar um dossiê provando as irregularidades nas construções, apresentadas junto com a obra). Esse tipo de trabalho crítico é o que fez o diretor da Tate Modern, Vicente Todolí, considerar as obras do chinês como "os mais socialmente engajados trabalhos artísticos feitos hoje no mundo".

Uma das principais características de Weiwei é o uso de elementos tradicionais da cultura chinesa como forma de dar visibilidade às tradições de seu país. Não raro suas obras reproduzem materiais que apropriam e ressignificam objetos do patrimônio político e sociocultural da China, como cerâmicas e vasos seculares, madeiras antes usadas em templos budistas de mil anos que foram demolidos pelo Partido Comunista ou reproduções de cadeiras utilizadas durante a dinastia Qing.

AFRONTA AO SISTEMA
Um dos episódios mais polêmicos da relação de Weiwei com o governo chinês, talvez, foi a construção do Estádio Olímpico Nacional da China (também conhecido como Ninho de Pássaro - abaixo) em 2008, para abrigar a Olimpíada em Pequim. Trabalhando como consultor artístico do escritório de arquitetura Herzog & De Meuron, que executou o projeto, ele foi um dos criadores desse símbolo dos jogos no país. Mas, em uma entrevista, ele disse considerar o fato de o país abrigar o evento como um "falso sorriso" em meio aos problemas chineses. O governo achou uma afronta. Em seu perfil no Twitter (@aiww), ele continuou a postar críticas ao regime comunista para seus mais de 40 mil seguidores, o que fez dele um dos maiores usuá¬rios dessa rede social na China - e provavelmente o maior detrator aberto do governo.

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Seu blog, mantido por mais de quatro anos, em que ele escrevia artigos e postava suas ideias artísticas e políticas, foi bloqueado pela censura em 2009. Tempos depois, descobriu que sua conta de e-mails no Gmail havia sido hackeada e as configurações foram alteradas para enviar todas as mensagens com cópia para um endereço nada familiar. Sua conta bancária foi vasculhada e o poste em frente a sua casa-estúdio ganhou um par de câmeras de segurança. Recentemente, e apesar da sua promessa de silêncio após a prisão, Weiwei publicou um artigo na revista americana Newsweek em que acusava o regime chinês de negar aos cidadãos "seus direitos básicos". "Sem confiança [no país], não se pode identificar nada: é como uma tempestade de areia. Tudo muda constantemente segundo a vontade de outro, de quem está no poder", criticou o artista. O artigo foi reproduzido internacionalmente por centenas de revistas e sites. A verdade é que essa ambiguidade entre ativista e artista fez com que Weiwei passasse a ocupar o topo de uma nova categoria de personalidade artística da qual, aliás, foi um dos precursores - e que possui outros nomes que estão ganhando mais repercussão, como o fotógrafo francês J.R. ou o grafiteiro inglês Banksy. "Muitos dizem que Ai está fazendo uma forma de arte performática", disse em uma entrevista à New Yorker o pintor chinês Chen Danqing, contemporâneo de Weiwei inclusive nas críticas sociais. "Mas eu acredito que ele já ultrapassou essa definição. Ele desenvolve algo mais interessante, mais ambíguo. Acho que ele quer, no fundo, ver quão longe a força de um indivíduo pode chegar."