terça-feira, 7 de agosto de 2012

As Ruas nos Chamam




O Estado Brasileiro não cabe em si de tanta barbárie, crueldade e violação de direitos. Foi assim construído sob a marca do escravismo, do racismo, do colonialismo e assim vai se embalando pelo apelo de suas entranhas, alimentado pelo neocolonialismo.


O Estado Brasileiro tem suas instituições de sequestro, como a polícia que, a serviço direto do sistema de justiça criminal, está apta a controlar uma classe (subalterna) a serviço de outra classe (abastada), conhecida como burguesia e que no Brasil tem seu pertencimento racial dominante. Tem uma atuação seletiva, marcando os negros como indivíduos de sua sanha punitiva. Somos os únicos marcados pelo neocolonialismo tacanho que nos dirige. Somos o único país com duas policias, uma militar com todo ranço dos tempos de chumbo que age contra nós como se inimigos fôssemos, Outra civil com seu repertório de tortura e espancamento, burocracia e ameaça como método de investigação.

Sim, existe uma luta de classes no interior do Estado Brasileiro e essa luta de classes é determinada pelo pertencimento racial, posto que o motor do sistema capitalista nacional é a apropriação de um segmento racial de todos os meios de produção, do monopólio da economia, da informação e da segurança em detrimento de negros e indígenas que vivem subordinados a uma violenta opressão racial e de classes. A politica de segurança pública não pode ser escamoteada pela novidade sociológica da promoção da igualdade e das bases comunitárias (unidades de pacificação).

Existe uma tragédia cotidiana que em ano eleitoral parece ser escondida nas salas ventiladas dos partidos. É o genocídio ao qual estamos submetidos, no campo e na cidade. As formas de eliminação das mais toscas as mais sofisticadas vão nos ceifando como num episódio de um romance de pós-guerra. O holocausto está aqui e baseia-se no sistema de justiça criminal que, quando não age diretamente com seus funcionários legais, omite-se onde deveria promover a justiça e os direitos para todas e todos. 

Os números já são eloquentes demais. Mesmo subnotificados eles nos anunciam o grande massacre de negros e negras dentro de um Estado Democrático de Direito. Dada sua magnitude, assustam até quem só tratava do tema para alguma distinção social ou enquanto discurso solto em seminários. 

Frente a este quadro perplexo e neste turbilhão, aqui se convoca a tomada das ruas, quer seja pelas barricadas, quer seja pela negociação direta de um outro modelo de segurança para que não amanheça em chamas a cidade.

Pois o que vemos é a flagrante capitulação das autoridades e representantes legítimos ou fabricados da população negra de mãos dadas ao inimigo que nos elimina enquanto povo, a juventude em sua fase mais produtiva, as crianças em toda sua expectativa e os idosos em sua sabedoria e experiência.

O Lixo acumulado em nossas comunidades, o precário atendimento de saúde em nossas localidades, escolas forjadas para um aprendizado precário com consequências drásticas para o futuro de jovens estudantes, em sua maioria negros. O Pacto Pela Vida, Programa de Segurança Pública apresentado pelo Governo da Bahia em 2011, num hotel de luxo, com um coquetel fino para os participantes não mudou nada em sua proposta de militarizar as comunidades negras com a promessa de garantir os serviços básicos naquele território.

Circule pelo Nordeste de Amaralina, Calabar, Fazenda Coutos e verá que os Status Quo antes de miséria e violência se perpetua com uma polícia que oprime, humilha e criminaliza comunidades inteiras com a anuência de políticos negros que se calam sobre o tema e vão levando suas candidaturas como sempre foram: barganhas e festas.

As mortes recentes em Saramandaia, Itinga , Portão , Sussuarana às quais tem policiais militares envolvidos, assim como temos denunciado há quase um década através da Campanha Reaja, nos dão combustível para nos agregarmos em torno de uma Campanha Nacional por Desmilitarização. Este quadro nos faz exigir do governo uma resposta que não seja mais violação ao principio da dignidade humana, como quando expõe fotos de suspeitos em um baralho fazendo da segurança um jogo com nossas vidas. Ou a triste memória dos 20 contêineres que serviram para confinar prisioneiros provisórios numa relação direta com os navios negreiros - lembremos que contêiner é para guardar mercadoria: como ainda se percebe, os negros ainda o são, nessa sociedade doentia.

Só resta à Reaja tomar as ruas e convocar os aliados para além dos gabinetes e dos grupos de estudos, para além dos militantes divididos entre partidos e tendências partidárias, convocamos os bairros, as ruas, as famílias atingidas e todos que se saturaram da ilusão a cada dois anos de que resolveremos nossas dores e tragédias, que encontraremos as respostas para a sociedade nessas urnas já corrompidas pelo racismo e o poder econômico dos “eternos detentores do poder”.

Marche conosco no Agosto Negro contra a Institucionalização do Genocídio, política de segurança no Estado da Bahia e no Território Nacional.


Hamilton Borges dos Santos (Walê)

Militante do Movimento Negro
Campanha Reaja
Quilombo Xis- Ação Cultural Comunitária.


Nenhum comentário:

Postar um comentário