O
Estado Brasileiro não cabe em si de tanta barbárie, crueldade e
violação de direitos. Foi assim construído sob a marca do
escravismo, do racismo, do colonialismo e assim vai se embalando pelo
apelo de suas entranhas, alimentado pelo neocolonialismo.
O
Estado Brasileiro tem suas instituições de sequestro, como a
polícia que, a serviço direto do sistema de justiça criminal, está
apta a controlar uma classe (subalterna) a serviço de outra classe
(abastada), conhecida como burguesia e que no Brasil tem seu
pertencimento racial dominante. Tem uma atuação seletiva, marcando
os negros como indivíduos de sua sanha punitiva. Somos os únicos
marcados pelo neocolonialismo tacanho que nos dirige. Somos o único
país com duas policias, uma militar com todo ranço dos tempos de
chumbo que age contra nós como se inimigos fôssemos, Outra civil
com seu repertório de tortura e espancamento, burocracia e ameaça
como método de investigação.
Sim, existe uma luta de
classes no interior do Estado Brasileiro e essa luta de classes é
determinada pelo pertencimento racial, posto que o motor do sistema
capitalista nacional é a apropriação de um segmento racial de
todos os meios de produção, do monopólio da economia, da
informação e da segurança em detrimento de negros e indígenas que
vivem subordinados a uma violenta opressão racial e de classes. A
politica de segurança pública não pode ser escamoteada pela
novidade sociológica da promoção da igualdade e das bases
comunitárias (unidades de pacificação).
Existe uma tragédia
cotidiana que em ano eleitoral parece ser escondida nas salas
ventiladas dos partidos. É o genocídio ao qual estamos submetidos,
no campo e na cidade. As formas de eliminação das mais toscas as
mais sofisticadas vão nos ceifando como num episódio de um romance
de pós-guerra. O holocausto está aqui e baseia-se no sistema de
justiça criminal que, quando não age diretamente com seus
funcionários legais, omite-se onde deveria promover a justiça e os
direitos para todas e todos.
Os números já são
eloquentes demais. Mesmo subnotificados eles nos anunciam o grande
massacre de negros e negras dentro de um Estado Democrático de
Direito. Dada sua magnitude, assustam até quem só tratava do tema
para alguma distinção social ou enquanto discurso solto em
seminários.
Frente a este quadro perplexo e neste
turbilhão, aqui se convoca a tomada das ruas, quer seja pelas
barricadas, quer seja pela negociação direta de um outro modelo de
segurança para que não amanheça em chamas a cidade.
Pois o
que vemos é a flagrante capitulação das autoridades e
representantes legítimos ou fabricados da população negra de mãos
dadas ao inimigo que nos elimina enquanto povo, a juventude em sua
fase mais produtiva, as crianças em toda sua expectativa e os idosos
em sua sabedoria e experiência.
O Lixo acumulado em nossas
comunidades, o precário atendimento de saúde em nossas localidades,
escolas forjadas para um aprendizado precário com consequências
drásticas para o futuro de jovens estudantes, em sua maioria negros.
O Pacto Pela Vida, Programa de Segurança Pública apresentado pelo
Governo da Bahia em 2011, num hotel de luxo, com um coquetel fino
para os participantes não mudou nada em sua proposta de militarizar
as comunidades negras com a promessa de garantir os serviços básicos
naquele território.
Circule pelo Nordeste de Amaralina,
Calabar, Fazenda Coutos e verá que os Status Quo antes de miséria e
violência se perpetua com uma polícia que oprime, humilha e
criminaliza comunidades inteiras com a anuência de políticos negros
que se calam sobre o tema e vão levando suas candidaturas como
sempre foram: barganhas e festas.
As mortes recentes em
Saramandaia, Itinga , Portão , Sussuarana às quais tem policiais
militares envolvidos, assim como temos denunciado há quase um década
através da Campanha Reaja, nos dão combustível para nos agregarmos
em torno de uma Campanha Nacional por Desmilitarização. Este quadro
nos faz exigir do governo uma resposta que não seja mais violação
ao principio da dignidade humana, como quando expõe fotos de
suspeitos em um baralho fazendo da segurança um jogo com nossas
vidas. Ou a triste memória dos 20 contêineres que serviram para
confinar prisioneiros provisórios numa relação direta com os
navios negreiros - lembremos que contêiner é para guardar
mercadoria: como ainda se percebe, os negros ainda o são, nessa
sociedade doentia.
Só resta à Reaja tomar as ruas e convocar
os aliados para além dos gabinetes e dos grupos de estudos, para
além dos militantes divididos entre partidos e tendências
partidárias, convocamos os bairros, as ruas, as famílias atingidas
e todos que se saturaram da ilusão a cada dois anos de que
resolveremos nossas dores e tragédias, que encontraremos as
respostas para a sociedade nessas urnas já corrompidas pelo racismo
e o poder econômico dos “eternos detentores do poder”.
Marche
conosco no Agosto Negro contra a Institucionalização do Genocídio,
política de segurança no Estado da Bahia e no Território
Nacional.
Hamilton Borges dos Santos (Walê)
Militante
do Movimento Negro
Campanha Reaja
Quilombo Xis- Ação Cultural
Comunitária.
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