quinta-feira, 22 de março de 2012

DA SUPRESSÃO DA DOR NO RAP

Por Arthur Moura 
Existindo como um discurso cético a cerca das multiplicidades da realidade, apesar de possuir uma estética que não se apresenta assim, o rap independente (ou underground) camufla-se com tinturas libertárias principalmente por vender uma ideia de produzir um contestamento social contundente e incisivo na sociedade. 
Mas o que ocorre é que dessa forma, inviabiliza-se a denúncia contra o opressor pelo fato de reproduzirem o discurso daqueles que os oprimem. Os modelos de ascensão, que é ativado quando se conquista determinado prestígio na cena, anunciam práticas que se afirmam através de ações coercitivas. 
Como, por exemplo, construir parâmetros ideológicos de conduta onde a veneração ao MC serve como ferramenta para este aplicar seus valores a fim de possuir o controle e afirmar seu projeto político. 
A forma como o eu-lírico se apresenta, de que forma desenvolve seu discurso e se afirma na sociedade são peças importantes para evitar certos hiatos em nossa compreensão. 
Por isso, devemos nos atentar para as consequências que o esvaziamento político, do qual o rap hoje sofre, vai acarretar para que estes continuem se afirmando como tal. 
Se práticas que reproduzem uma sociedade de consumo despossuída de desejos mutáveis e diversos são os parâmetros de uma cultura que se afirma libertária, temos que propor uma reavaliação convocando, inclusive, aqueles que se interessam por enriquecer o debate. 
Partimos do princípio de que a forma que antes portava a dor, a angústia e a potência de mudança que todo esse acúmulo proporciona, esta forma transmutou-se ao ponto de suprimir a dor pelo desejo de consumo. 
Consumo de ideias ideais, novidades, posturas, discurso, moral, conduta, controle, doutrina. A dor foi camuflada, esvaziada e sua aparente força recuou-se. O discurso agora opera na órbita do fascínio e do desejo. 
Da postura radical corporal e despotencializada na sua fala. A potência direcionou-se para a fabricação das sensações que contemplam o prazer e o gozo. 
A satisfação da construção do eu-lírico transmutou-se no norteador de sua postura política. Nesse contexto, o rap não disputa, mas apresenta-se como somador de forças dessa normalidade mais palatável que sentimos cotidianamente.

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